quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Ele, o parto

Relato de parto - parte 1




De tanto ouvir Anunciação na barriga, Davi veio ao mundo em uma manhã de domingo.

Os sinais começaram tão cedo quanto a ansiedade. Dez dias antes, fui pra Santa Casa de Cabreúva com cólicas pra ser avaliada. Eram quaaaaase 2cm de dilatação, nem perto da brincadeira começar - e fui embora frustrada. No dia seguinte a frustração deu lugar a uma paz pela informação: ainda não era hora, mas tá chegando. Ok. Respira e não pira. Fui viver a vida, já de olho na data provável de parto - 24 de dezembro. Nesse dia, as contrações e cólicas vinham com um certo ritmo e fiquei empolgada achando que era dia - mas não era. 

Conversei com uma amiga enfermeira obstetra (@sementematerna) e ela me orientou a passar um longo tempo no chuveiro e observar se as contrações aumentavam ou diminuíam. Fui, feliz da vida, mas o banho quente fez as dores passarem, assim como meus motivos pra procurar a maternidade. "Amanhã, quem sabe", pensei e fui dormir. Dia 25 nada, 26 nada. 

Vinte e seis foi um sábado normal: fizemos faxina, almoço, dancei, dei risada, vimos série na Netflix até tarde. Em um dos episódios, passado da meia noite, comecei a marcar o tempo das dores, sem alarde. Não queria me empolgar de novo pra elas passarem e não ser hora ainda, mas dentro de mim algo dizia que era...

Meia noite e meia e desisti de ver série, as dores vinham com intervalos de 3 minutos - ótimo sinal! Falei pro meu marido (@gui_leo_davi) que se continuasse assim por mais meia hora, totalizando uma hora cravada, iríamos pra maternidade pra eu poder ser avaliada. 

Essa foto na varanda foi mais ou menos nessa hora. Aguentei até uma e meia, tomei um banho e falei: "e aí tá preparado pra ter um neném?!", mas acho que na verdade e estava perguntando pra mim, mesmo. 

Chegamos na Santa Casa por volta das 2h mas estava apenas com 2cm de dilatação, o que quase me matou de frustração. Como assim, nem um cm de dilatação a mais??? Que saco! Mesmo assim, fiquei em observação: fiz cardiotocografia, tomei Buscopan e nada da dor ir embora. A enfermeira obstetra @adriana_piinheiiro me orientou a ficar um bom tempo na bola de Pilates no chuveiro. Fui pro Quarto Semente com o coração cheio (em outro relato especifico tudo o que esse quarto - esse projeto - representa pra mim). 

Sob a água quente e com a companhia indispensável do meu marido, vi as dores aumentarem. A cada "onda" elas vinham mais intensas. Eu já não estava marcando o tempo, só sabia que doía. E com o tempo, fui perdendo a pose e as posições. Doía sentada, eu me levantava. Doía de pé, sentava de novo. Água nas costas, água na barriga, mãos agarradas nas barras na parede. Lembrava com uma constância incrível de uma das entrevistadas do documentário A Dor do Parto. Ela dizia que quando tinha contrações, fechava os olhos e contava: um, dois, três... até passar. Eu lembrava dessa moça e tentava contar, mas me perdia em todas as contagens. Deixei pra lá e continuei meu mantra de ais e uis, tentando respirar o máximo possível.

Num certo ponto, tudo o que eu queria era deitar um pouco, minha lombar doía bastante. Perguntei a hora pro Guilherme, ele respondeu que eram quatro e quinze. Fiquei em choque. Como assim já faz duas horas que estou aqui? Pedi pra que ele chamasse a enfermeira, pra perguntar se eu podia me deitar. As 4h30 ela me reavaliou e fui internada com 5 cm de dilatação. Uma evolução e tanto pra uma primigesta, até eu sabia disso. Um misto de alegria e medo, coberto de uma dose de realidade de que agora era hora e não dava pra voltar atrás.

Nessa hora, passei mal. Não conseguia mais falar e, quando tentei, vomitei por todo o banheiro todas as ânsias que não tive durante a gravidez. Não foi uma cena bonita. Mesmo sabendo que o parto é um evento cheio de secreções, a gente - no fundo - quer que seja tudo limpinho. Da vergonha. Da medo. Dói. Suja. Mas é assim. 

Daí pra frente, fiz caminhada no Solário, sob a luz da lua e a brisa de verão. Cada contração que me parava, me punha caretas na cara, me fazia pensar que estava perto. Aquele momento tão esperado, desde antes de engravidar. A hora de parir, de por no mundo. Que medo. 

Não sei que horas eram, mas atingi a dilatação total. "A partir de agora pode fazer força, quando sentir vontade" - me disseram. "Não quero", pensei. "Quero, mas não quero. Vai doer. Vai rasgar. Vou me machucar, não quero" - eram pensamentos recorrentes. Eu sabia que a hora da covardia chegava. Já presenciei ela chegando pra duas mulheres cujos partos eu assisti e li relatos demais pra achar que comigo seria diferente. Senti medo durante todo o trabalho de parto. Pensei na palavra cesárea o tempo todo. Mesmo assim, havia uma voz na minha cabeça - a minha voz - pedindo calma e me dizendo que eu sabia que tudo isso ia acontecer, que eu sabia como tudo isso ia acontecer e que eu havia feito a minha escolha com consciência e clareza. "Calma, respira, que vai dar tudo certo."

Cada método não farmacológico de alívio da dor foi me salvando de desistir (não que fosse uma opção real, mas na minha cabeça até que era). Banqueta, rebozo, banheira. Lembro também de mãos fazendo massagens com um óleo que esquentava, bem na minha lombar - não sei se eram do meu marido ou da enfermeira porque nessa altura do campeonato eu mal ficava de olhos abertos, tentando ao máximo respirar e me concentrar no meu corpo. Lembro da voz da enfermeira, das mãos do meu marido, apertadas pelas minhas. Lembro dele encostar o rosto no meu, falando perto do meu ouvido palavras de amor e incentivo. 

Lembro que me foi dada a escolha: poderia ir pra banheira pra aliviar a dor, mas talvez a água retardasse o trabalho de parto. Ou podia continuar na banqueta e ir para o expulsivo. Escolhi a banheira. Eu vi ela chegar, ser instalada, inaugurada, testada, vi enfermeiras recebendo treinamento sobre parto na água, escrevi sobre ela e tirei muitas fotos pra não querer estar lá. Sempre quis. Sempre sonhei. Até achei que meu bebê poderia nascer lá. A água, que sempre foi minha amiga, me abraçava e acalmava. Me agarrava no meu marido e o apertava, consciente de que ele devia estar desconfortável com os apertos mas cansada demais pra falar qualquer coisa. Aquela banheira resgatou um pouco da minha energia e calma. Eu estava com medo do expulsivo e uma parte minha quis adiar aquele momento. 

Na água, minha bolsa rompeu naturalmente. Era a hora de fazer força e eu tinha medo. Mas também queria que ele nascesse. Queria poder descansar. Estava sem dormir e não sabia que horas eram. Queria parar um pouco mas sabia que não dava. Voltamos pra banqueta pra por o bebê no mundo e eu demorei pra entender onde colocar a força. Tinha os olhos fechados o tempo todo, ouvia a enfermeira e meu marido, ouvia outras pessoas no quarto - médicos e outros profissionais aguardando o bebê nascer.

Precisei de algumas longas forças pra conseguir trazer meu filho. Eu consigo lembrar claramente - uma lembrança sensorial - da sensação dele passando e acabando com toda a dor, do corpo escorregando depois da cabeça, mas a lembrança da dor anterior é maior - talvez por isso muito se fale sobre a dor do parto e muito pouco sobre o alívio que ele traz. Pari Davi sentada na banqueta, abraçada pelo meu marido.

Assim que veio ao mundo, ele foi dado pra mim. 

Davi nasceu as 6h38, na Santa Casa de Cabreúva (SUS) num parto normal humanizado sem intervenções. Nasceu com 2,920 kg e 48 cm, amparado pela enfermeira obstetra plantonista.

Quando ela me entregou o bebê, vi que ele estava molenga e não chorava. A enfermeira me disse com toda a calma "respira, que ele está com o cordão umbilical ainda e tá tudo bem. Respira". Eu percebi meu marido tenso com a cena, mas não consegui falar nada. Estava ofegante, coração acelerado. Sentia meus olhos apenas semi abertos, mas agora via tudo, entendia tudo. Havia saído da partolândia e estava apenas me acostumando com a claridade. 

Como já tinha visto alguns partos fiquei tranquila com o corre corre que se seguiu, apesar de alerta. Aquela equipe sempre teve toda a minha confiança. O cordão foi cortado rapidamente e o bebê levado ao pediatra, ali, do meu lado. Eu segui no chão, na banqueta, abraçada pelo marido e assistida pela enfermeira, que cuidadosamente, como quem tece algo numa lã muito delicada, me ajudava a parir a placenta. O procedimento foi sutil e totalmente indolor (na verdade não sei se normalmente isso dói ou não, mas vi uma certa poesia no movimento de enrolar o cordão em câmera lenta e ir puxando a placenta centímetro por centímetro. Ela tinha um rosto calmo, concentrado, mas em paz. E quando olhei pra ela e pra placenta e entendi que tinha realmente - finalmente - parido meu filho, fiquei em paz também). 

Enquanto isso, a equipe cuidou do bebê, que nasceu cansadinho pela demora do expulsivo. Ele chorou, o pediatra nos acalmou, tudo estava bem. 

Eu fui sendo avaliada e cuidada, o bebê também, mas todo esse acaso não permitiu que ele ficasse comigo nesses primeiros momentos, nem que mamasse na primeira hora. Meu marido também não pode cortar o cordão umbilical, mas tudo ficou bem e era isso que importava.

Tive uma laceração de 1 grau e precisei levar um ponto. Da banqueta, me levantei para ir até a maca e assustei com o sangue escorrendo por entre as pernas. Um sangramento normal e esperado no pós parto imediato, mas eu assustei mesmo assim. Enquanto cuidavam de mim, meu marido babava no nosso bebê. Vi seus olhos brilhando, sorrindo pra mim e pro bebê. Esse momento foi mágico e eu fiquei em paz.


Nos minutos seguintes, carreguei um pouco o bebê, ainda deitada. Logo em seguida, fui sozinha tomar um banho - sozinha porque não havia necessidade de acompanhamento e não por desleixo do hospital. Estava bem, alerta, sem dores. Tomei meu banho enquanto preparavam o quarto pra gente e meu marido ninava nosso filho. Fomos os três para o alojamento, onde ficamos juntos até a alta hospitalar, 36 horas depois. 

Na minha mente, apenas um pensamento: "caraca, eu consegui. Eu achei que não conseguiria, mas eu consegui."

Eu pari. Ele nasceu. 
"Deu certo."

Quem ler esse relato cheio de medo e dor, pode pensar que a experiência foi, de alguma maneira, negativa. O medo não é nosso inimigo, nem tampouco a dor. Eu sei, parece coisa de budista, parece conversa fiada. 

Digo sem sombra de dúvida que algumas coisas me salvaram de cair no penhasco onde o medo passa a ser descrença, pânico, desistência:

- A confiança nos protocolos da humanização implantados firmemente no hospital que me atendia; 

- A confiança de que, apesar do medo e da dor, meu corpo foi divinamente projetado para esse momento que é, por mais que a gente tente negar, fisiológico, natural;

- A tranquilidade de ter comigo em todos os segundos uma pessoa da minha confiança, pronta pra me amparar, me cuidar, me proteger e me dizer o que eu precisava ouvir. Alguém que passou meses (muitos antes até de eu engravidar) me ouvindo falar sobre humanização, fisiologia do parto, posições pra parir, intervenções desnecessárias, métodos de alívio da dor e jeitos de me ajudar nesse momento. Alguém que se dispôs a ver documentários e muitos vídeos de gente parindo por aí. 

Esses três, juntos, foram os responsáveis por me permitir fechar os olhos, olhar pra dentro, me conectar com o que estava acontecendo com o meu corpo, minha mente e meu coração naquelas horas e viver, de fato, o parto. 

O parto normal, o parto humanizado, o parto rápido, o parto sem intervenções, o parto com final feliz. O parto em que eu não era a fotógrafa, a repórter, mas a mulher. A leoa. A mãe. O parto tão desejado, tão almejado. Pro qual eu estudei e me preparei e no qual me vi muito antes desse momento chegar. 

Todo esse "preparo psicológico" me conduziu pra esse momento. Pra essa alegria dolorida e intensa. Pra essa conquista. Essa coisa que eu fiz, porque fui mulher, porque fui forte, porque fui força e fortaleza. Porque fui natureza e permiti que natureza fosse, em mim. 

E assim, me fiz mãe. E esse olhar fez tudo valer a pena.




sexta-feira, 27 de novembro de 2020

ela, a barriga

Primeiro, ela demora pra aparecer. Depois, quando aparece, é toda tímida e faz a gente parecer que acabou de sair de um rodízio japonês. Depois os botões começam a não fechar e ela surge de vez, toda pomposa, cada vez mais redonda. E quando você acostuma com ela, como se sempre tivesse sido assim, vê as fotos de umas semanas atrás e leva um susto: meu deus, como cresceu!!

Com o tempo, os chutes e cambalhotas são sentidos. Primeiro, só por nós, mulheres. Depois, os papais entram na jogada e começam a sentir também, conforme ficam mais fortes. Chega uma hora que a cada mexida lembra um camelo transverso (ou um alienígena tentando sair) e dá até pra filmar e mostrar pras pessoas. 

No terceiro trimestre, algo começa a enroscar nas costelas. Os soluços começam a ficar irritantes, porque são tão fortes... Levantar da cama já não era fácil e agora é uma aventura. 

Ela começa a pesar. Olhar pro chão e não ver os pés é uma novidade divertida. Falar "com a barriga" já não é algo esquisito (meses de prática + as respostas que vem em forma de chutes e pulos e giros, do carinha lá de dentro, ajudam muito).

E vai chegando a hora de me despedir dessa barriga redonda. É, estamos no nosso último mês. Claro, que o próximo encontro será inigualável, incomparável. Junto com a expectativa por ele, vem a saudade dela. Da barriga. Dessa introspecção. Dessa coisa só nossa. Das coisas que só a gente sabe e sente e divide. De te ter tão pertinho, tão protegido, tão confortável! Do nosso silêncio... 

Mas o tempo ruge, a Sapucaí é grande e os dias hão de passar. E você vai embora e vou trazer meu bebezinho. E lembrarei sempre com muito carinho dos nossos nove meses. 

#babyrosadearruda

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Amanhã é 23



Hoje, eu me deitei para dormir cedo, como tenho feito nós últimos meses: uma fresta da janela aberta, um gato ao pé da cama, meu marido ao meu lado. Dessa vez, ele dormiu profunda e rapidamente com a mão sobre a minha barriga. Bem ali, onde ele tocava, senti nosso bebê chutar de dentro do útero. E eu sorri no escuro com essa cena. 

Pensei nesse ano maluco, nesse ciclo que se encerra em meio a uma pandemia, que tanto faz a gente lembrar dos problemas, das dificuldades, das solidões, dos medos... Mas lembrei, principalmente, que foi nesse ciclo que realizei dois grandes sonhos: me casei (de véu e grinalda, lua de mel, chuva de bolhas de sabão e tudo depois) e engravidei. 

Pensei na lua de mel, na dança, no meu emprego e saúde, nas amizades cada vez mais seletas mas cada vez mais poderosas. Pensei no quanto eu me aproximei da minha família nesse dois mil e vinte. Pensei no prazer e na segurança que esse lar me oferece. Um lar cheio de gatos e móveis e amor. Um lar cheio de sonhos concretizados, cheio de risadas e outros sonhos que ainda vão nascer. E sorri no escuro com cada um desses pensamentos. 

Esse ano, a comemoração está sendo assim: eu, meu marido, meus gatos, meu neném chutador, um delivery ou outro, caixas de Bis, pijamas e os olhos brilhando em direção ao futuro que se anuncia. E acho que nunca estive antes tão feliz, tão em paz, com o meu aniversário, com meu ano, com o fim e o começo de ciclos tão importantes. 

É, 27, você foi demais! Obrigada, Deus, obrigada, Universo. 28: só vem.

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

O segundo foi que foi


Difícil essa coisa de contar semanas. Primeiro porque parece que elas não passam nunca. Os meses voam, mas as semanas... se arrastam! Depois porque as inúmeras tabelas que tentam "converter" isso em meses ou - pior - trimestres (!!!) são todas diferentes e contraditórias. Mas, mesmo considerando a mais pessimista e enrolada das tabelas: passamos. O segundo trimestre foi-se.

Hoje, começo a vigésima oitava semana. O que significa que estamos no sétimo mês de gestação e  daqui 9 semanas (quando completar 37), a gestação estará "à termo", ou seja: a partir daí qualquer hora é hora, basta o bebê querer nascer. Eu, ansiosa que sou, nem fico me falando muito isso não. A conta é sempre até as 40 semanas: faltam 12! 

FALTAM DOZE SEMANAS PARA O NATAL, MEU POVO! (Sim!)

No segundo trimestre o medo de abortar foi embora. O medo de enjoar foi embora (embora tenha rolado uma ou outra azia, mil xixis por noite e, de vez em quando, até insônia). A barriga estranha que parecia só sedentarismo foi embora. A coisa foi crescendo e arredondando e um dia eu acordei e me deparei com uma barriga de grávida. Uma inquestionável barriga de grávida. Que delícia. 

Já desisti de fechar as calças... Fico bem irritada quando preciso me vestir e preciso trocar de roupa várias e várias vezes porque as coisas não ficam mais tão bonitas ou confortáveis. É bem chatinho... Mas, vivo basicamente de pijamas, então, vida que segue. Enquanto isso, lavar e dobrar roupinhas de bebê virou uma espécie de hobby. Depois da crise do "ai meu Deus, eu não fiz nada ainda", chegou o berço, a cômoda passou a abrigar roupinhas delicadamente lavadas e dobradas e organizadas e separadas por categoria (#luaemvirgem), o quarto já tem quadros e pelúcias e sabonetinhos de bebê e sapatinhos e um milhão de fraldas de boca e toalhas de banho e toda a sorte de coisas bordadas, personalizadas, com crochê e fita - e, juro, tem mais coisas pra chegar, porque aparentemente essa criança será a mais mimada da face da terra.

Ainda faltam, sim, algumas coisas pra serem providenciadas. Coisas que, as vezes, as contas do mês não permitem que você resolva logo. Mas dá tempo e não estou mais agoniada com o tempo que ruge. 


O segundo também foi de muito mato. Espinafre e abóbora e vitaminas de mamão com iogurte e  frutas no café da manhã e tudo o mais. Nunca antes um pacote de batata palha durou tanto nessa casa, juro. Mas essa semana, confesso, eu tô tão de saco cheio da cozinha, que não consigo mal entrar lá. 

Também teve muito mais choro. De amor, de alegria, de raiva, de solidão. Com comercial de maquiagem, com vídeo sobre educação de crianças, com basicamente qualquer coisa. É um misto de estar grávida com estar em distanciamento social. Mar de Hormônios na Praia de Sozinha o Dia Inteiro. É bem difícil. E tem dia que tá suave. Vai entender...


Teve muito chute. Que estranho e que gostoso é sentir um bebê mexendo dentro da sua barriga. Sabe nos desenhos animados quando as barrigas ondulam, pra demonstrar fome? É exatamente assim, depois de algumas semanas! O bebê encosta em tecidos que a gente não costuma sentir. A história deles sapatearem nas bexigas, é real. E dá pra sentir e  é imediata a vontade de fazer xixi, é divertidíssimo, apesar de ser a milésima vez que vou ao banheiro na última meia hora.... 

Ah e teve um susto também, quando, um dia desses, subi no banquinho pra pegar o liquidificador no armário e aquela coisa virou e me esborrachei de costas no chão. A bunda deu uma amortecida na queda, mas a cabeça também bateu. Fiquei deitada no chão, esperando a adrenalina baixar - meu coração estava disparado - e tentando entender o que tinha, de fato acontecido. Comecei a chorar e respirei fundo pra me acalmar. Esperei e dor nenhuma veio. Alisei a barriga, o neném chutou. Pensei: "tá tudo bem" e levantei devagar. Desisti do suco que ia tomar e fui pro sofá, ver se ia sentir alguma coisa estranha. A bunda doeu um pouco e de resto, ficou tudo bem. Levei uma bronca de um marido bem bravinho - como se eu tivesse outra opção a não ser subir no banco pra pegar coisas no alto - e agora toda vez que faço isso, o faço com atenção e medo redobrados. 

Demorou, mas passou. Foi que foi, que nem vi. Cada dia, a sensação é diferente e estranho estar num momento tão... Libriano rss

Que venham as próximas semanas, de crescimento, de ansiedade, de emoções à flor da pele. Que nem o inferno astral tire o brilho desses dias tão únicos. 

 E que o umbigo demore pra saltar. Amém.



segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Mas quem é que nunca se sentiu assim?

Ando tão à flor da pele, que qualquer inseto na varanda me faz chorar...


Até pra quem tem companhia, gestar é um processo solitário pra porra.
E gestar na pandemia é a própria cela solitária.

E mesmo eu, com toda a terapia, já entendo quem diz que grávida tem medo de tudo. Mesmo assim, sigo escolhendo confiar na natureza do meu corpo pra cuidar de tudo. 

Ao longo da gestação, já caí - literalmente - três vezes e foram momentos bem assustadores. Cada um com a sua intensidade. Mas nada é tão assustador quanto aquelas lágrimas que sobem da garganta, ardem o nariz e escorrem desavergonhadas e mudas. Mudas porque não falo. Não sei que dificuldade é essa de dizer o porquê choro. Já tá chorando mesmo, desgraça, se fosse pra disfarçar, que engolisse as lágrimas, como a humanidade vem fazendo há milênios.

E aí, porque não falo, a garganta arde e se aperta. 

Me sinto só. 

Só, com a torneira que não funciona, com a bagunça que não acaba, com a sujeira no chão e a pia cheia. Me sinto só com os chutes de dentro pra fora, com a grana que não chega no fim do mês. Me sinto só com a comida por fazer, com a falta de ar sob a máscara, em ser a única sem cerveja no almoço de domingo. Me sinto só. Em não me encontrar nas conversas dos homens sobre futebol e nem no futrico feminino lá na sala. Me sinto só no movimento de estar junto. Em tantos momentos que já nem sei se a coisa é assim mesmo ou se estou exagerando por causa dos hormônios. Me sinto só.

Só no sofá. Só na insônia de madrugada. Só na preocupação.

Parece que aos poucos a mulher vai ficando mais e mais opaca, mais e mais transparente e invisível. Talvez pra dar lugar à mãe. Imagino que o processo pra ambas coexistirem demore a acontecer... Não queria. Acho que a mãe se sentirá só sem a mulher.

Me sinto só. Me sinto infantil diante das minhas tantas necessidades emocionais. Diante de tantas demonstrações que espero receber. Me sinto só por estar fisicamente bem e não poder me vangloriar mas, também, não poder reclamar. Me sinto só. 

Como se ninguém entendesse o quanto de coisas acontecem sob um corpo grávido. Parece, pra quem olha de fora, que estou apenas grávida. Algo mais natural impossível, certo? Mas, definitivamente, esse processo visível vem acompanhado por uma porção de outros, cada vez mais intensos. 

E nem os gatos ligam mais pra mim, habituados que estão com a minha constante presença em casa durante a pandemia. E ao redor de casa, tudo é silêncio. Crianças não gritam, mães não falam ao telefone, furadeiras cansaram de trabalhar. O silêncio é absurdo. Por isso fico tapando ele com músicas e podcasts. Hoje, que não o fiz, me sinto só.

Só. Somente só.

Queria colo, queria ser mimada como se estivesse a fazer - e estou - o mais importante dos trabalhos e todo o resto pudesse esperar porque agora só me mimar importava. Queria ser constantemente abraçada e que me lembrassem de beber água, com o copo já na mão. Peguei pra você. Quer sim! Queria não ter tempo pra sentir falta dessas miudezas. Queria não ter que fazer pedidos. 

E além de só, queria não me sentir culpada por cada um desses sentimentos. Queria não ter vergonha e nem pensar que, ao sentir-me assim, magoo alguém que, de repente, acredita que está fazendo o que deve como deve. Me sinto só e culpada. Me sinto carente e nunca gostei de ser essa pessoa - talvez por isso ainda seja... 

Sinto o inferno astral se instalado com força. Os fins dos ciclos são sempre pesados, pra quando acabar mesmo, a leveza se instalar.

É como dizem... Vai passar.

Mas enquanto não passa, é isso. 

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

É menino!


Pronto, filho. Agora já sabemos que você é um menino, como suspeitávamos, e podemos te chamar pelo nome que escolhemos: Davi.Tenho certeza que não faltarão oportunidades pra, quando você crescer, contarmos o porquê desse nome. Primeiro, ele é curto, simples, forte. Um nome tradicional, histórico, até. Depois, porque foi o  primeiro e único nome que eu e seu pai concordamos. Mas, principalmente, porque é uma espécie de homenagem a um amigo muito especial do seu pai.

Um amigo que eu não cheguei a conhecer mas que, pelo que seu pai conta, foi uma pessoa corajosa, serena e cheia de sabedoria pra compartilhar. E foi uma pessoa muito sorridente - daquelas que sorriam sempre. Isso eu não tenho tanta certeza, mas gosto de imaginar assim, pois só o vejo nas fotos com o sorriso bem aberto, daqueles sorrisos que franzem até os olhos. Então, acho que essas quatro características fazem dele merecedor dessa homenagem. Com certeza seu pai vai poder te contar muitas outras...

De uma certa forma, acho que isso representa também a importância que têm os amigos de verdade. Demora até que a gente os encontre e os perceba, filho. Muitos amigos vão e vem com o tempo. Mas alguns estarão sempre conosco, mesmo que não estejam por perto. E isso tem uma força, uma magia...

Agora, que sabemos que você é o Davi - e até temos alguma ideia de como é o seu rosto - a ansiedade em te encontrar cresceu ainda mais. As pessoas já dizem com quem você se parece e seu quarto já começa a tomar forma. E eu estou aqui, ainda em quarentena, escrevendo, sentindo seus chutinhos e tentando imaginar como será quando você nascer.

E já imagino a gente em diversos lugares, vivendo várias aventuras - e você recebendo amor de todos os lados. Você já é muito amado e querido e esperado. E quando você chegar, o que não vai faltar é colo e abraço e beijo e brincadeiras e sorrisos pra você.

Espero que você chegue num mundo mais saudável, mais tranquilo. E que a gente possa ir ao parque, piscina, praia, na casa do vô, na pracinha. E brinque de carrinho e leia histórias e faça cabanas e acaricie gatos e ouça música e cante e converse e sonhe. 

E tomara que seu pai toque cada vez mais violão pra você - porque eu também amo! - e que ligue a moto pra você dar risada do tremelique do motor. E que seu vô deixe você brincar na grama e depois puxar folhas das árvores do pomar. Que seus tios te carreguem nos ombros, que suas avós te encham de beijos nas bochechas e mimos. E que a gente possa ser cada vez mais feliz - mesmo diante das dificuldades e perrengues. 

Mamãe te espera ansiosa, filho! Cresça bem gostosinho aí na barriga. Curte essa água e esse escurinho, que eu te espero numa boa. Quando chegar a hora, pode vir, que eu te carrego. Te nino e te ajudo a entender esse mundo doido, iluminado, barulhento e meio frio, as vezes. 


terça-feira, 18 de agosto de 2020

a neura nossa de cada dia

A dor e a delícia do isolamento social é o tempo livre. As vezes é muito bom (mesmo) não estar mais naquela correria doida, não ter compromissos todos os dias, não ter que olhar na agenda pra não correr o risco de marcar duas coisas pro mesmo horário e nem ficar calculando qual hora vai sobrar pra comer ou fazer xixi no meio de tanta tarefa. Mas, ao mesmo tempo, diz o ditado: cabeça vazia, oficina do diabo. 

Eis que, diariamente, me pego com uma neura ou ansiedade diferente. Às vezes, ela dura poucos minutos, às vezes vai a tarde toda. Ontem, por exemplo, estava na bad da profissional que foi obrigada pela pandemia a abrir mão dos planos e metas quase alcançadas, dos inúmeros freelas e parcerias e tudo mais. Estava claramente angustiada achando que minha carreira (as três ou quatro) tinham acabado e que meus esforços dos últimos anos tinham sido em vão. 

Durou uma horinha, até começar a rir do podcast Calcinha Larga e esquecer da neura.

Hoje, ao contrário, acordei bem. Vendo as fotos do meu celular, encontro uma do dia em que meu guarda roupa foi instalado e estava, portanto, perfeitamente arrumado. Bateu a bad de pensar no estado do mesmo. "Pô, tô em casa todo dia o dia todo e tá tudo uma zona". Mas como essa era uma neura fraquinha demais, com ela veio emendada a neura número dois do dia: o quarto do bebê não tá nem perto de estar pronto.

Ok, faltam 19 semanas pro Natal. Mesmo assim, o quarto do bebê continua sendo um closet bagunçadinho. As coisas do neném estão enfiadas em sacolas e malas e os carrinhos estão empilhados embaixo de um lençol roxo. Nada ali remete a um quarto de bebê. Não tem berço nem cortina nem enfeite nem nada. Aí veio a bad "não fiz nada ainda" que, claro, veio acompanhada do medo do isolamento social acabar e, portanto, acabar o tempo livre e aí eu, cada vez mais e mais barriguda e sem ar, me arrepender de não ter feito tudo isso antes. 

Não aguentei. Fui lá e esvaziei a parte de cima da cômoda do bebê (que estava cheia de coisas nossas...), esvaziei meu pedaço do guarda roupa onde ficarão as gavetas, assim a roupa que estava lá já foi arrumada nos lugares onde ficarão daqui pra frente. Guardei sapatos e vestido de festa... Guardei as coisas do bebê todas juntas e liberei o espaço do berço. Amanhã vou limpar as patas de gatos das paredes. 

Já deu um certo alívio no coração "adiantar" essas coisas. Essa semana ta passando devagar, mas em breve chega o berço (daqui uns dez dias...) E isso também vai fazer com que eu me sinta melhor... Estou efetivamente ficando ansiosa com mais frequência, ao mesmo tempo com medo e querendo que o bebê chegue logo, que o tempo passe, que chegue logo o segundo natal no #o13dobloco5, dessa vez com chorinho de recém nascido.

Vou arrumar algum artesanato pra fazer pro quarto do bebê, pra passar o tempo, me acalmar, me ocupar e sentir útil. Me aguardem...

domingo, 9 de agosto de 2020

Escolhas

Hoje é domingo, dia dos pais. Fiz um almoço caprichado pro meu, recebi ele na minha casa arrumada e limpinha com uma caneca de cerveja geladinha e um abraço apertado - sim, passamos os últimos 4 meses e meio sem abraços, mas hoje eu burlei as regras e dei um abraço no meu pai. E aí, no final do almoço, quis tirar uma foto com ele e o meu marido. O meu pai e o pai do meu filho.

E aí fiquei pensando... Quando eu estava pra nascer não sabia que família me receberia. A gente normalmente atribui essa escolha a Deus - uma força do universo que deixou tudo preparado para a nossa chegada. E fui muito bem recebida. Tive e continuo tendo todo o amor, carinho e apoio da minha família - pai, mãe, irmãos, tias... Mesmo meus avós, que já se foram, sempre foram queridos e cuidadosos (minhas principais memórias com meus avós maternos são meu avô me recebendo na casa dele com chocolates e minha avó me fazendo roupas na sua velha máquina de costura ou bolos na sua cozinha). 

Hoje, no entanto, é o primeiro dia dos pais que passo com um filho na barriga. Um bebezinho, que ainda está se formando e crescendo e se preparando para estrear nesse mundão de meu Deus. 

E aqui, talvez, eu decepcione um pouco o leitor desavisado. Explico: eu sei que a gente tem, por unanimidade, um certo apreço pelas histórias cheias de conveniências  do destino, acasos inexplicáveis, almas gêmeas que a vida tenta separar mas não consegue e coisa e tal. Mas hoje quero falar sobre escolhas. 

Eu - escorpiana, com ascendente em capricórnio e lua e virgem, ou seja, a rainha do controle - deixei sim o destino fazer sua mágica, mas fiz, principalmente, escolhas. Tomei decisões. E escolhi, com todas as letras, quem haveria de ser o pai dos meus filhos. 

O leitor mais informado pode achar estranho, porque sabe que a gente tem uma história cheia de amor à primeira vista, paixão avassaladora, coincidências e entregas - e dramas - dignos de um filme da Disney. Mas conforme a coisa foi rolando e paixão e drama foi se consolidando em amor, admiração, parceria, companheirismo... Eu fui, dia após dia, escolhendo esse homem para ser o meu companheiro de vida. Meu marido. Meu abrigo. Meu parceiro na criação de crianças incríveis. 

Quando ele me pediu em namoro ele me disse "me sinto feliz por ser VOCÊ". Claro: sempre quis ser mãe, mas na minha cabeça isso vinha depois de uma série de acontecimentos e vinha com uma noção bastante clara das premissas primeiras - daquilo que eu esperava daquele que estaria do meu lado. E é assim que eu me sinto nesse momento: feliz, sim, muito, por estar grávida. Mas feliz, principalmente, por ser de um filho dele. Do meu marido, meu melhor amigo, meu amor. Por estarmos na nossa casa, nosso canto, nosso aconchego. Construindo nossos sonhos - os individuais e os conjuntos, juntos. Por rirmos tanto - e por eu poder chorar no seu ombro também.

Hoje eu tenho exatamente a vida que eu sonhei, desejei e planejei - ao lado da pessoa como eu sempre sonhei. Então, é isso: nesse dia dos pais, um brinde de cerveja zero álcool ao pai que Deus escolheu pra mim e ao pai que eu escolhi pro meu filho!

Um brinde ao destino e às escolhas, que nos trouxeram exatamente até aqui.

Um brinde a esses homens maravilhosos que acrescentam tanto à nossa vida. 


A esses dois - meu pai Carlos e meu marido Guilherme - todo meu amor e toda a minha admiração sempre pra sempre.







sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Te vi lutar

Era sábado e era primeiro de agosto. E era o dia em que você disse que pararia de fumar.

Colamos o adesivo bem cedinho, pra ser compatível com os seus horários durante a semana. Logo de manhã, você começou a pedir cigarros. Era piriri. Aquele desespero pelo negócio que só quem já fumou e parou pode entender - e não é meu caso. Mas você foi aguentando.

Fizemos faxina, tomamos café, nos vestimos e fomos passear. A rua distraiu você. Fomos comprar coisas fofas de bebê  e comemos lanche e visitamos meus pais e fomos na loja e escolhemos seu presente do dia dos pais - um tênis, claro.

Quando chegamos em casa, o piriri voltou. O hábito demora pra ser remodelado, eu sei. E era só o primeiro dia. Mesmo assim, fui dura com você. Mesmo assim, fiquei meio brava com o pedido. Até que me rendi e te dei um cigarro. E disse, ainda, como quem acha que manda, "só esse hein".

Você disse que sua boca encheu-se d'água quando viu o cigarro. O sorriso que você deu e o brilho nos olhos, foi até bonito de ver. Caímos na gargalhada. Quem é que saliva por um cigarro, meu Deus? E rimos e rimos. 

Você foi pra varanda - lugar tradicional do cigarrinho - e foi aí que eu vi você lutar. O cigarro ia de uma mão para a outra, da mão para a boca, da boca para a orelha. Entre uma coisa e outra, você mexia no celular, falava comigo, mudava de ideia. Foi ficando sério. Estava - eu via! - tentando adiar aquele momento, adiar aquela decisão. E você foi lutando, se enganando, adiando ao máximo. Conseguiu esperar até as 16h e foi uma vitória e tanto, mesmo eu tendo guardado os confetes. 

Foram dezesseis horas sem cigarro, já que o último fora perto da meia noite... Eu sei, foi difícil. Está sendo um pouco ainda. E sei que você está fazendo isso pelo nosso bebê. E te agradeço. Te agradeço muito. Te agradeço pois tenho muito claro o quanto isso será importante pra você, pra mim e o Bolis. A curto, médio e longo prazo. 

Saiba que, dessa vez, essa decisão não poderá ser revogada. Mas saiba também que logo ficará mais fácil e já já será natural. E que ver a saúde do teu filho crescendo ao teu lado será uma bela recompensa por essa decisão tão madura.

Eu te vi lutar essa semana toda. E no terceiro dia você já conseguiu ficar sem nenhum cigarro. E hoje já é o quinto dia sem fumar nenhunzinho! 


E por essas e outras te amo cada dia mais.


Não esquece. 

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Carta da metade que já foi

Filhote, 

mamãe tá aqui em casa, de quarentena. É uma palavra estranha, mas que quer dizer que não podemos sair de casa sem ser por um bom motivo. Nem sempre foi assim e, honestamente, espero que passe rápido. É que lá fora está rolando uma pandemia - que é quando uma doença se espalha muito rápido entre as pessoas - e ficar em casa é mais seguro pra nossa saúde. Talvez, se não fosse pela sua existência, mamãe teria que estar na rua todos os dias, trabalhando normalmente. O papai está trabalhando fora: ele sai de casa todo dia bem cedinho, antes do Sol nascer e volta pra casa a tarde. Já eu estou trabalhando daqui mesmo, assim protejo a você e a mim e consigo cuidar melhor da gente nessa fase tão importante.

Hoje, você completou 20 semanas dentro de mim. Normalmente, um bebê fica em torno de 40 semanas dentro da mãe. Quando você crescer, vai entender que isso é metade. Estamos exatamente no meio do caminho:  é a mesma distância entre você surgir dentro de mim e hoje e entre hoje e o dia de nos conhecermos cara a cara (a menos que você se apresse e queira nascer antes...).

Ainda não tenho certeza do seu nome - se Davi ou Helena - porque a médica não conseguiu ver direito no exame, então talvez você note que a mamãe não fala muito com você durante o dia. Tem sido um pouco difícil essa parte, por enquanto, mas você sabe que eu falo mais que a boca, porque quando o papai chega é um falatório só, né, Bolis?

Por isso, mamãe decidiu ler pra você. Também é um pouco estranho, mas até os gatos vem deitar pertinho pra ouvir. Eu escolhi o primeiro livro da saga mais importante de todas: Harry Potter. Mamãe cresceu lendo essas histórias sobre amizade e coragem e tantas outras coisas boas. Foram esses livros que me fizeram gostar de ler tanto. Espero que você esteja gostando de ouvir a voz estranha da mamãe, mesmo que ainda não entenda as palavras. Mais pra frente, a gente recomeça e eu te conto de novo essa história...

Quero que você saiba que tem sido muito bom ter você comigo. Você é muito amado e foi desejado desde antes de ser. Algumas mamães tem alguns problemas na gravidez, mas por aqui está tudo bem. Você só me fez ter muito soninho no começo, mas nada que tirar uns cochilos com você não tenha resolvido. Mamãe tem passado bem e tenho me dedicado a cuidar bem da gente: comendo coisas saudáveis, dormindo cedo, tomando sol. Quando você chegar vamos continuar a fazer isso juntos e vai ser ainda mais legal! 

Ainda falta um tempo pra você nascer, mas por aqui já tem várias coisas acontecendo pra preparar a casa pra você. Papai fez um guarda roupa lindo, pro closet poder ser seu quarto e reformou  uma cômoda que já foi da sua tia Fabiana e do seu pai. Compramos seu carrinho, uma almofada bem gostosa pra você poder mamar bem confortável e várias fraldas coloridas, bem estilosas e que não poluem o meio ambiente... Seu vô e sua tia Lúcia te deram um berço. Sua tia Thaís vai encher seu quarto de desenhos de gatinhos e sua vó Cleide está fazendo à mão sapatinhos e uma colcha de lã. Você já tem um montão de roupas e até sapatos, porque seu pai adora sapatos! Seu pai também está cuidando melhor da saúde dele, pra poder cuidar um montão de você! E já estamos planejando levar você pra conhecer o seu vô Ulisses lá no Paraná e acampar e nadar na piscina e um monte de coisas legais. Talvez você tenha um balanço na casa do vô e da vó, que tal? Seria muito divertido... 

Bom, essa primeira metade foi muito boa, filhote. Espero que a próxima seja tão gostosa quanto e que você chegue saudável, feliz, sabendo que você é amado e querido. Não tenha pressa para nascer. Eu vou ter paciência de te esperar. Venha quando estiver pronto... Mas isso é papo pra próxima carta.

Com amor, 

Mamãe. 




sexta-feira, 17 de julho de 2020

Dia cento e vinte

Hoje eu chorei. Chorei porque chamei e meu marido não ouviu. Chorei porque a TV tava ligada e a jornalista tava falando de reforma tributária as cinco da manhã! Chorei porque ontem engoli e hoje não deu.

Meu marido perguntou o que tinha acontecido, que eu estava chorando. Só consegui dizer: "não aguento mais ficar em casa." Ele me fez cafuné e concordou. "É, tá foda..." Depois, dormi no melhor abraço do mundo e meu coração sossegou.

Sim. Tá foda. Tá difícil e eu fui liberada oficialmente pelo meu terapeuta para reclamar o quanto eu quiser! haha Agora que minha barriga tá toda redonda e toda roupa me deixa com cara (e pancinha) de grávida, tudo o que eu queria era estar desfilando ela, eventualmente, por aí.

Quero ir em lojas ver coisas fofas e minúsculas. Quero fazer aulas de pilates. Quero a visita na minha maternidade. Quero rodas de conversa no pré natal, quero participar da Semana Mundial do Aleitamento Materno. Quero ver gente e quero que gente me veja.

Já deu de isolamento!

QUERO BOTAR MINHA PANÇA NO SOL!


segunda-feira, 22 de junho de 2020

É tri!

Sobrevivemos ao primeiro trimestre.
Doze longas semanas (oito, se contar a partir da descoberta!).

Longas porque o medo de não chegar na décima terceira é sempre um fantasma, pra todas as mulheres. O primeiro trimestre é o que tem a maior chance de abortos espontâneos, é nele que o projeto de bebê é formado em sua base, é nele que descobre-se as chances de anomalias e síndromes. é muito medo.

Segui uma estratégia simples: não me misturar com essa gentalha. Explico: é um tal de grupo, página, insta e tudo o mais que se possa imaginar reunindo grávidas mil do país e mundo. Amém, coisa linda. E aí cinco minutos depois comecei a notar os pensamentos negativos, as reclamações, as especulações sobre dores e medos e sangramentos. E aquilo me assustou. Decidi não cair nessa e dei dois passos largos pra trás. Eu hein.

Lembrei de quando tomei Roacutan - o mais forte remédio para espinhas, tão forte que precisava assinar várias guias de conhecimento sobre os efeitos colaterais para retirar o remédio da farmácia (coisa que nunca vi acontecer nem pros tarjas pretas - para o que, pelo que sei, bastam as receitas em dia). Eu li a bula na íntegra, antes de tomar o primeiro comprimido. Já sabia dos terrores que poderiam vir. Mas li inteira, cada linha miúda. E decidi ao final que não teria nenhum dos sintomas graves. Passei por quase um ano de tratamento com muita sede, cabelos maravilhosos e muito hidratante nos lábios. E só. Dos males o menor.

Quando descobri a gravidez, o primeiro medo foi do enjoo. Passei anos da minha vida vomitando todos os dias. Passava mal a toa, qualquer coisa tirava meu estômago dos eixos. E respirei fundo e disse: vou ter é nada.

Não sei se as palavras tem poder, se a lei da atração existe ou se Deus achou que minha cota de vômitos estava batida, mas sobrevivi ao primeiro trimestre totalmente incólume aos enjoos.

Tive sim muita fome, muito sono e alguns episódios de dores intensas de cabeça. Diminuí a cafeína, voltei ao chá de camomila. Aumentei um pouco o consumo de "comidas da minha mãe": frutas, verduras e legumes.

Tava tudo lindo, tudo certo.

Numa quinta-feira, quando completei 12 semanas, levei um tombo. Caí de cara, mão e joelho no chão. Me ralei, fiquei com dor no pulso, mas me levantei tranquila - não senti a barriga contra o chão, "acho que nem encostou." Quatro dias depois um sangramento mínimo (eu juro que era mínimo, quase que imperceptível), me assombrou. Será que bati a barriga quando caí? Será que tem algo acontecendo? Algo está errado? E então eu rezei. Eu rezei com a mão na barriga e mentalizei um mantra: "meu bebê é saudável, meu bebê é perfeito, meu bebê é feliz". Repeti inúmeras vezes. Há tempos eu não sentia um medo tão colossal. Tão avassalador. Nesse dia, chorei. Chorei quando achava que estava sangrando, chorei quando me dei conta que não estava. Então maternidade é assim? Até quando está tudo bem a gente tem medo de que isso mude nos próximos minutos? Deus me ajude hahaha

Na quarta-feira seguinte, fui fazer o tal do ultrassom morfológico do primeiro trimestre. Comi um chocolatinho na vã esperança do Bolotinha virar e deixar ver se é Helena ou se é Davi - apesar de estar cedo ainda... E foi sensacional ver o bichinho se revirando todo... Dobrava e esticava as perninhas, com aqueles pezinhos cheios de dedinhos. E mexia os bracinhos e dava cambalhotas, até que sossegou e parou de costas (o que, honestamente, eu amei! ver aquele pontilhado perfeito da coluna vertebral e minúsculos risquinhos, que na verdade eram costelinhas, quase me matou de tanto amor!). Teve também um coraçãozinho barulhento, que ouvimos por mais tempo que da outra vez e a boa notícia de que as medidas da translucência nucal estavam perfeitas - o que descarta síndromes e anomalias.

Então foi só alegria.

E agora, sobrevivemos ao primeiro trimestre.

A barriga começa a arredondar, começa a piorar o ódio às calças. Os vestidos e pijamas (agora tamanho G) viraram novos amigos. E eu to aqui só na ansiedade pra barriga ficar maior que os peitos e parecer mais do que uma pancinha de 90 dias sem atividade física só comendo de quarentena rsrs

Agora a brincadeira vai pra fase 2, fase de comprar coisinhas, preparar o quarto, crescer e crescer. Bora! Não vejo a hora!

domingo, 14 de junho de 2020

graças a deus a adolescência demora

Ontem me peguei com medo de ser mãe de um(a) adolescente.

Sim, pois é. Pulei a gestação, o parto, as fraldas, as noites sem dormir, o cocô até as orelhas, a socialização com os gatos, a introdução alimentar, o primeiro dia na escola, as crises, as doenças, as  birras, os tombos, os medos e pesadelos. Pulei os terríveis dois, três, cinco e quantos mais puderam inventar e me peguei com medo de ser mãe de adolescente.

Logo eu, que fui uma adolescente comportada, com notas boas, muitos livros, que passei a pré adolescência lendo a Bíblia para crianças menores e a adolescência em si em grêmios e voluntariado, entre aulas de dança e a associação do bairro, seguida de uma precoce candidatura a vereança... Logo eu que dei o primeiro beijo depois de velha e arrumei o primeiro namorado no colegial (lembro até hoje do meu choque ao saber que uma amiga já transava...). Logo eu que vi um cigarro de maconha pela primeira vez depois dos vinte (poderia ter aceitado, mas não tinha nem curiosidade nem estômago). Logo eu que nunca fugi de casa, nunca saí escondida, nunca menti sobre meu paradeiro até ser bem adulta pra isso. Logo eu, que não dei nenhum vexame no carnaval - não até comprar meu primeiro apartamento.

Logo eu. Me peguei com medo de ser mãe de adolescente. Medo dele encontrar com o mundo cedo demais e eu não saber o que fazer. Porque eu sei lidar com livros de poesia hipocondríaca e amores platônicos. Mas não sei se saberei lidar com a bebida e as drogas e as mentiras e as fugas e o celular desligado. Eu nunca deixei de atender a uma ligação dos meus pais. Mas já fui acordada inúmeras vezes por eles, na vã esperança de eu saber do paradeiro do meu irmão. Ontem me peguei com medo dessa agonia - e de outras piores.

Eu vivo dizendo que tem vários motivos pra um bebê demorar cerca de 40 semanas pra ficar pronto pra nascer. Um deles é pra dar tempo da gente se preparar pra chegada daquele serzinho tão dependente de nós. Começo a pensar que é exatamente por isso que a adolescência demora uma década e meia. Porque é uma preparação que demora. E as coisas vão ficando mais difíceis aos poucos, pra gente ir lidando com coisas cada vez mais complexas, até chegarmos na grandona. No chefão. Na coisa que tira o sono de pais pelo mundo inteiro - imagino eu.

Mas depois que lembrei de dá tempo de se preparar pra isso - e pensei que todo o processo ajuda a esse monstro não ser assim tão invencível - me acalmei e voltei a pensar em fraldas e no tal do pescocô.

Baby steps, né?

domingo, 31 de maio de 2020

Enxoval da índia-parideira

Quando eu decidi que ia para Portugal eu pesquisei muito. Cidades, estradas, rotas, linhas de trem e ônibus, bairros de Lisboa e Porto, passeios essenciais, bons restaurantes, informações sobre o clima, o custo, o jeito de falar. 

A internet é um lugar fascinante pra obter informações sobre tudo. E eu, apesar de não ter nascido nessa era, cresci e me desenvolvi nela. Aos poucos as barsas sumiram, vieram os disquetes, que logo sumiram também. O papel almaço com pauta deu espaço ao Word. E por aí vai. O jeito de aprender mudou. 

Buscamos por dicas e orientações em linhas de blogs, em vídeos do Youtube, em relatos dos posts de Instagram. Eventualmente conversamos com pessoas - conhecidas ou não - sobre um tema ou outro. Temos acesso a muito mais especialistas - e sem nem sair de casa.

E eu sou da geração de mães que tem acesso e interesse a informações mil sobre maternidade. E que tem um olhar diferente das nossas avós e mães - porque as evidências científicas vão mudando e se atualizando e eu cheguei por aqui nesse momento: do novo comprovado. Mas as avós e as mães não: elas criaram seus filhos (e eu, de certa forma) de outro jeito. Com outro olhar. Com outras preocupações. 

Eu sou - desde muito antes de pensar seriamente em ter filhos - o que eu chamo figurativamente de índia-parideira (a imagem de uma mulher indígena ou tribal parindo seu filho "no meio do mato", sozinha ou com ajuda de outras mulheres da tribo, uma mulher que não entregará seu bebê a aspirações e colírios ao nascer mas sim o segurará entre os braços e o levará às tetas, sem neuras com saída maternidade e sem chupetas coloridas ou decoradas com strass: essa imagem sempre fez um sentido tão grande, tão forte, pra mim. E essa imagem me faz ter a sensação do quanto de moda a gente inventa sem necessidade - pra gastar, pra enfeitar, pra postar).

Quem me lê já sabe: eu fui amamentada até os 3 anos. E sempre tive plena convicção de que aquela escolha da minha mãe tinha sido crucial para a minha saúde. E mesmo que as pessoas rissem de mim e rissem da ideia de uma criança que anda e fala e mastiga mamando nas tetas da mãe, eu sempre soube que, quando chegasse a minha vez, amamentar seria uma prioridade. 

Nos meus tempos de fotógrafa e jornalista da saúde eu conheci muitas grávidas. Conheci muitas enfermeiras, médicas, fisioterapeutas, fonoaudiólogas, psicólogas e nutricionistas que me ensinaram sobre parto, sobre amamentação, sobre os problemas infinitos que um bico de plástico pode causar a um bebê. Aprendi sobre exterogestação, sobre criação com apego, sobre a importância de dar colo. A importância da livre demanda de leite. A extrema necessidade de confiar em si e na sua fisiologia: pra parir, pra amparar, pra alimentar. Aprendi sobre carregadores, sobre posições de parto, sobre hora dourada e pele a pele. 

E tive o prazer de assistir a quatro nascimentos. Quatro estreias, como gosto de chamar. Quatro mulheres se tornando mães, quatro bebês chegando a esse mundo. Dois partos normais e duas cesáreas. E posso dizer: se eu puder escolher, se eu tiver saúde e chance, eu já sei qual será a minha escolha. Quando vi a primeira cesárea eu pedi a Deus: que esse seja o mais perto que eu chegue de uma. 

E cá estou: grávida, há 10 semanas e 3 dias. E há dias que eu voltei minhas pesquisas para as rotas, estradas, dicas e custos não de Portugal, mas de ter um bebê. E eu sei que estou aqui, fazendo escolhas sem experiência nenhuma. Tenho um bocado de teoria e tenho a ajuda de milhares de mulheres e especialistas que já viveram essas coisas antes de mim.

E cá estou indignada por quase todas as listas de enxoval começarem com um kit de boicote à amamentação logo na primeira linha. Dizem as quantidades de fraldas que você deve providenciar - já considerando que você concordou em sujar a natureza eternamente com fraldas descartáveis  e como se não houvesse opção. Cadê as índias-parideiras produzindo conteúdo, por Deus? Cadê a Bela Gil dizendo que não precisa comprar kit papinha antes do bebê nascer, já que ele só vai comer depois de 6 meses?

Cadê as mães minimalistas, preocupadas com o meio ambiente, que não vão comprar ações da FisherPrice mas sim intercalar uns brinquedos bonitos e coloridos com umas tampas de panela e sei lá o que? 

Um bom e grande lado meu sabe exatamente o tipo de mãe que quer ser. Já estudou, já pensou, já analisou as possibilidades e tem boas diretrizes gerais para ir se pautando- e está bem e feliz com essas diretrizes porque eu realmente acredito nelas e na minha capacidade de faze-las dar certo. O outro gostaria muito mesmo de encontrar por aí outras mães que acreditassem nas mesmas coisas, apenas pra ter um amparo emocional rs. Queria muito achar uma lista no Pinterest que me dissesse exatamente o que fazer - e com a qual eu concordasse haha simples assim.

Acho que essa é a primeira lição da maternidade: aprender a confiar nos próprios instintos. 

Nenhuma mãe será igual a outra. E eu certamente não serei. 

Acho que vou ter que criar meu próprio jeito.












segunda-feira, 20 de abril de 2020

Bolotinha

19 de abril

Hoje Bolotinha ganhou o primeiro par de bodies da Thaís e do Alan. É uma sensação escandalosamente gostosa, abrir um presente que nem é pra você, mas pra um bebê que ainda vai demorar meses pra chegar, de fato. E esse sim, é meu presente.

Ontem, junto com a notícia, dei um par de sapatinhos jeans, o mais unissex possível, para o Guilherme. Na verdade, é de Bolotinha. E é a coisinha mais cheirosa e pequenininha do mundo. Tem cheiro de docinho, cheirinho de bebê.

Bolotinha. Guilherme não gosta que eu chame assim. Podia ser pipoquinha ou filhotinho ou paçoquinha. Sei lá. Mas é Bolotinha, porque foi a primeira palavra que veio à cabeça, assim como o cachorro chamou Tuxo, porquê esse foi o primeiro nome.

Bolotinha me fez comer uma laranja hoje. Logo eu, que tenho a maior dificuldade de comer frutas. Também fez com que meu pai me desse todo primeiro pedaço de toda comida que ficava pronta. Não importava se já tinha me privilegiado nas vezes anteriores, o primeiro era sempre meu. De Bolotinha, na verdade. Mas mesmo a comida sendo de Bolotinha, o carinho era meu. 

E depois deitei na sala e vi filme e ganhei café da minha mãe. E falamos sobre nomes e coisas aleatórias sobre bebês e grávidas. E foi a primeira vez que falei: eu tô grávida. Assim. Com todas as letras. Ainda preciso ensaiar pra poder falar pro meu terapeuta haha

Amanhã provavelmente será dia de tirar sangue pra saber exatamente de que tamanho Bolotinha está. Mas antes, café da manhã e fruta, como nos meus sonhos mais disciplinados. 

E a vontade de contar pro mundo já é cada vez maior.

♥️🥰




Mas será?

18 de abril

Qual a probabilidade de uma pessoa ver dois risquinhos onde só tem um usando óculos Google pesquisar


Sono. Muito sono. Daqueles que você dorme a noite inteira (depois de uma certa dificuldade pra pegar no sono por causa de ansiedade), acorda e já já tá com sono.

Sensação de febre (pode ser psicológico de medo do coronavírus)... Frio e depois calor e depois muito frio e depois muito calor.

Tesão descomunal. Não pode encostar em nada, não pode ver nada sugestivo. Um gato ronronando entre as pernas ou a vibração da máquina de lavar ja dão vontade de transar. As vezes só de pensar ou lembrar também.

Fome. Dias e dias comendo como uma condenada à morte. Matando a vontade das coisas todas. Strogonoff, lanche, lasanha, shimeji. 

Cheiros incomodam. Guilherme abre a geladeira e não sente nada, mas lá da sala eu sei que tem algo estragado lá dentro.  O cigarro na varanda entra todo diretamente na minha narina, não importa onde eu esteja. Até a ração dos gatos é esquisitamente incômoda.

Peitos maiores que nunca. Inchados, empinados. Deus abençoe e guarde. Amém.

Estou me sentindo louca. Toda hora vou ver a foto do palito com dois riscos pq o segundo palito ficou com uma listra bem fraquinha e agora acho que eu tô vendo coisas onde não tem. Se bem que eu tinha bebido MTA água e meu xixi tava aguado, sei lá. E aliás, quem mija 10 segundos sem parar? São 200 xixis por dia, nem sei como tem tanta água no bagulho. Mas enfim, toca mijar no palito de novo. Mais dois palitos e, no total, oito listras depois, não dá pra achar que tá errado né? 🙄

Estou grávida!

Alô, alô, teste

17 de abril


Eu não ia fazer isso hoje, mas eu fiz. Passei o dia ontem com dores estranhas, sensação de febre, muito sono. Na hora de dormir: nada. Um advil e um calmante natural pra dormir pra lá de meia noite. Hoje, caí da cama cedo para ir (figuradamente, pois só fui até o closet) pra terapia.

Estamos de quarentena desde o dia 20 de março, que foi meu ultimo dia de trabalho in loco. Depois disso vim pra casa e de lá pra cá mal saí. Tenho ido ao mercado, padaria, eventualmente na casa dos meus pais. Tenho feito comida. Pra alimentar, pra animar, pra distrair, pra deliciar. Fiz bolo e lasanha e parmegiana e mais. Tenho comido como se não houvesse amanhã. Foda-se. Quem consegue se preocupar com peso, com uma pandemia avassaladora tomando conta do planeta?

Hoje o dia foi pior que ontem. A terapia foi pesada, dei uma chorada e depois disso não consegui fazer nada a não ser me manter ocupada com serviços domésticos. Lavei a varanda, limpei a cozinha, aspirei o pó, lavei louça, fiz almoço, comprei areia pros gatos.

Tomei um banho daqueles que lavam até a alma. Quente. Calmo. Lavei os cabelos cada vez maiores, respirei fundo, apreciei o silêncio. Saí levemente revigorada...

Agora à tarde, voltei a me sentir fisicamente mal, dores no corpo, dor de cabeça, sono, muito sono. Coloquei o roupão - meu melhor amigo - deitei na cama e me cobri. Os dois gatos pretos se enroscaram em mim e eu quase cochilei.

E ai, num súbito, fiz o que disse que não faria até amanhã cedo. Fiz xixi num potinho e espetei um palito lá dentro. Quando coloquei o treco no xixi, fechei os olhos e contei dez segundos. Já fiz alguns desses na vida pra saber o spoiler que ele dá, conforme absorve o liquido e a macha rosa vai se espalhando até virar uma ou duas listras.

Coloquei o palito na horizontal assim que contei dez, ainda de olhos fechados. Terminei o xixi, me vesti respirando fundo. Que medo de olhar e ver - de novo - aquela listrinha solitária, aquele risquinho fajuto sozinho no mar rosa molhado de xixi. Que medo de ter sido precipitada (como quase sempre).

Foi tudo estrategicamente planejado: faço o teste, jogo fora e já tiro o lixo. Pelo sim, pelo não, fica o segredo. E se eu ficar desapontada, ninguém precisa ficar sabendo!

Abri os olhos e me virei. O gato estava impaciente, em cima da pia, esperando que eu abrisse a torneira pra ele beber água - maldito gato mimado!! Dois risquinhos dividiam, lado a lado, o palito branco. Corri pegar a caixa do teste no lixo, pra ver qual listra era do que, já que uma estava mais clara... "o tom pode variar conforme o nível de Hcg"... Oh my God. OHMYGOD. Permaneço séria. Registro o momento. O coração dispara. Meu primeiro impulso é pegar o computador e escrever.
Tomei um copo d'água gigante e corri pra cá.

Minha cabeça está agitada. Parece que não é real. Meu ímpeto é descer na farmácia comprar outro teste. Mas não, calma, cara pálida. Quais as chances de estar errado? "Respira, relaxa e curte o momento, que é seu", penso.

Em breve, eu vou dividi-lo com as pessoas mais importantes do meu mundo. Mas hoje, agora, esse deleite, essa alegria, essa novidade é minha. Só minha.


quinta-feira, 19 de março de 2020

Eu e as Anas



Uma designer. Uma confeiteira. Uma bailarina.
Com muitas coisas em comum, mas com muitas diferenças.
Duas librianas e uma escorpiana sofrendo pra equilibrar as balanças.
Três mulheres. Três empreendedoras. Três histórias de negócios, de sonhos, de iniciativas.
Três momentos pra três empresas diferentes. Tem barco que já tá no mar há anos. Tem pão saindo há pouco do forno. Tem neném recém parido, chegando fresquinho, pronto pra mudar o mundo. 

Mas essas três mulheres tem uma coisa em comum. A convicção - posta à prova diariamente - do quanto a gente pode contribuir umas com as outras. De que juntas vamos mais longe. De que juntas, somos mais fortes. Mais focadas. Mais determinadas.

Porque empreender nunca foi tarefa fácil (e em tempo de coronavírus, o coração gela só de pensar nessa palavra...), e nem é fácil o processo de se conhecer a ponto de entender seu sonho, seu destino, o legado que você quer construir. E mesmo depois que você entendeu, como é difícil seguir acreditando...! Que é real, que é possível, que dará certo, que valerá a pena, que se é capaz...! É difícil. Temos momentos de voar baixo, empoderadas, decididas, brilhantes...! Mas tem momentos que a gente tem medo. E duvida. E se questiona. E olha pra trás, cogita a zona de conforto... E chora e grita e resmunga.

Eventualmente uma das outras duas aparece pra tirar a que está em crise desse lugar e dizer "Ei, para de maluquice! Olha o quanto você já fez até aqui. Lembra onde você começou. Não desiste hoje não, deixa pra amanhã"...

E entre mortos e feridos todas sobrevivem. Todas persistem. Todas continuam. 

Que essa foto lembre a gente que a gente não precisa ser forte o tempo todo porque tem com quem contar! E que a gente permita que as outras mulheres empreendedoras nos inspirem, nos fortaleçam!  

Que a gente tenha boas risadas, planos mirabolantes, muitos clientes e motivos pra comemorar nas próximas décadas! Obrigada por tudo! Amo vocês!



terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

carne com batata


Um dia, escrevi um texto chamado Amálgama, pra dizer que somos feitos da mistura de muitas coisas e pessoas com as quais nos deparamos no decorrer das nossas vidas. Um textinho que tem um lugar no meu coração e que foi parar até em um livro - o Devaneios Atemporais.

O que não me atendei a comentar, na época, é que essa mistura nunca fica pronta e nem vai pro forno. Ela descansa, como massa de pão que precisa crescer. E fica ali num eterno sova, descansa, sova descansa... Nunca estamos prontos. Nunca nos acabamos. Nunca somos os mesmos.

É o que o Cortella diz em uma palestra: "não nascemos prontos e vamos nos gastando (até morrer), mas sim nascemos não-prontos e vamos nos fazendo (até o fim da vida sem nunca estarmos prontos)".

E estou dizendo isso porque ontem me peguei em casa às cinco da tarde, picando batatas. Sim. Piquei batatas em quadrados miúdos porque fui tomada de uma necessidade - uma vontade, um desejo, uma saudade - de carne moída com batatas. Nem sei dizer onde comi, principalmente por se tratar de um prato tão comum - mas definitivamente não foi na casa da minha mãe, já que ela teria trocado as batatas por um quilo de cheiro verde e eu provavelmente eu não teria comido. 

Não sei o que me deu. Só sei que na minha cabeça essa era uma comida de acalentar o coração. De dar um abracinho na alma. Talvez nem seja, necessariamente, uma memória. Mas um pedido do corpo e da alma por uma comida de verdade, dessas que alimentam de calor e cheiro. Uma comida de 'to aqui, cuidando de você', igual sopa quando estamos doentes. 

Enquanto fazia a janta, picava batatas e cebolas e descongelava a carne, fiquei pensando nessa nova amálgama. Quando foi que virei essa pessoa - que sai de casa de manhã com a louça lavada, a sala varrida, a roupa lavada, a planta molhada, o gato comido, a cama feita e que, quando volta, sente desejo de carne moída com batatinhas? 

Quando foi que virei a pessoa que preza por cada um dos minutos dentro de casa? Que recusa vento na cara ao som do batuque carnavalesco e pensa na gripe e no sofá. Não que isso seja, necessariamente, ruim... Não que isso seja, necessariamente, bom. Mas é. Só é.

Virei uma pessoa que ao invés de comemorar o início de um novo ciclo, lamenta. Ao invés de suspirar aliviada, se frustra. Uma pessoa que só quer sair se tiver lugar pra sentar, sabe?

Pode ser só o mercúrio retrógrado, é verdade. Mas acho que algo em mim vem mudando nos últimos tempos... Ando me tornando mais uma pessoa que quer criar e cuidar das raízes que uma pessoa que quer ganhar o mundo. Entende?



É... às vezes nem eu. 







segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Sem o trabalho, o quanto sobra de você?

Estou vivendo uma experiência interessante há quatro horas. 

Pouco mais de dois anos atrás, transformei meu Instagram pessoal para um "Instagram de Bailarina", um profissional, um meio de propaganda, de lançar meu nome no mercado...

Hoje, fiz uma segunda conta pra Jaqueline-Pessoa-Física, apaguei as coisas pessoais mais recentes desse "insta profissa" e dei start num mundo online onde não sou nem a jornalista, nem a fotógrafa e nem a bailarina/professora de dança. 

Primeiro desafio foi preencher a tal da Bio. Quem sou eu? Como se apresentar sem cair na tagarelice de falar o que fazemos, ao invés de quem nós somos...?

O que sobra de você quando seu trabalho não existe? A casa, a família, os livros não terminados, o vinho recém aberto, as jantas entre-amigas, o tédio de domingo, as danadices dos gatos, as férias? E pra quem, como eu, vive de um trabalho pro outro: que horas você está apenas sendo você? 

Se quarenta horas por semana sou jornalista e pelo menos noutras seis sou bailarina... e tem umas 50 em que estou dormindo... Eu sou apenas eu mesma... três dias por semana?

Quando você encontra um meio de ganhar dinheiro "fazendo o que gosta" e cada um dos seus hobbies viram trabalho... o que você faz apenas pelo bel prazer?

Como eu costumo dizer pro meu terapeuta: dava pra beber e falar disso a noite inteira! Hahahaha Eu hein!

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

quiche

Hoje eu li que "luxo é ter tempo, é ter liberdade, é ter uma horta no quintal". Eu considero que comer bem, comer "quentinho, fresquinho, feito em casa", seja uma espécie de luxo. Um luxo que podemos e queremos, mas que paramos de nos dar (essa parte é meio confusa de entender)...


Cozinhar dá trabalho. Faz sujeira. Suja louça. Sempre tem um ingrediente que você queria mas esqueceu de comprar. Nem sempre dá pra seguir receitas... Nem sempre dá certo no final..

Mas tem uma magia em se viver a coisa em todo o seu processo... do desejo, do planejamento, da fome... passando pela seleção dos ingredientes, escolha dos temperos, pelo corte em quadrados ou rodelas, pela bagunça, pelo caos... lidando com a paciência... entendendo que cada coisa tem seu tempo... e que a torta será atrasada em alguns minutos, porque você decidiu acrescentar frango desfiado... (e se você não descongela a carne, você não come!) até a parte de desenformar e cortar e servir e ver se deu certo...

Viver a coisa em todo o seu processo faz a vida ter um pouco mais de sentido... de lógica.

E não há nada como aprender uma coisa nova! Não há nada como fazer as coisas com as próprias mãos...!

[quiche de palmito, tomate, cebolas roxas e frango]