terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Dentro dela toca música

O texto abaixo foi escrito ontem, durante a chuva, com os fones de ouvido isolando meu cérebro do falatório familiar. Estava ouvindo Beirut, uma banda muito peculiar, que recomendo pra quem gosta do que é diferente. Eles misturam mil sons numa só música e me fazem pensar em coisas coloridas, mato e cheiro de chuva.


O texto foi composto da seguinte maneira: ouvindo as músicas (ouvi quase o cd inteiro) e escrevendo. Simplesmente. Sem correções, sem pensar demais. Só escrevendo as imagens que me apareciam.

Particularmente, gostei do resultado e achei um exercício fácil e divertido. Imaginar coisas sem se importar com o resultado, com os leitores ou consigo mesma. Só escrever.


Se puderem, ouçam Beirut ao ler, ou antes, pra saberem do que eu falo. Espero que gostem.


Cai chuva lá fora e dentro dela toca música. Os bandolins e violinos e tambores e pandeiros e vozes e o som d’água caindo nela se misturam numa dança mágica. Cada um num passo diferente, crescendo e rodopiando como nas histórias que lhe contavam nos seus tempos de escola. Os pés descalços batem no chão, contando as batidas do seu corpo.

Tan tan tan ta ra ram e tum tum tum tum tan tan tan, papapa papapa tam tum tum tum...

As cores começam a perseguir as flores e as tomam. As mãos ora agarram as bordas do vestido ora ficam livres pra bailar, leves, dum lado ao outro, acima da cabeça e a frente do rosto. Valsando na terra, fazendo erguer a poeira, na ponta dos pés. Cigana joga o cabelo ao vento, movendo-se com seu assovio.

Tum tum taratata! Tum tum tararatata! Tum tum ta! Tum tum ta! Tum tum ta!

Como um coração, cigana bate palma. Pulsa o sangue, vem mais gente ver dançar. O cheiro da música traz as fadas pra roda. E gira, gira, o sol caindo. Não para. Pés no chão, cigana gira, gira mas não cai.

Música não para, mas muda de cor como os retalhos do lenço que a cigana deixara ao chão, como o coração dos que a viam se mexer por trás das árvores, enamorados e destuídos. Salta, brinca com quem ninguém mais vê.

Tata nana nana. Pararam. Panana rararam. Rararam. Tararatata. Pa rara raram. Tum tata tum. Tum tata tum. Plim pa na ra, plim plim tum tum tatum.

O vestido molhado começa a pesar. Os cabelos compridos escorrem no rosto e nas costas. Cigana ergue os braços aos céus, celebrando a chuva. Bendizendo-a e rodopiando como criança em dia de festa. Sorri, pois sabe que seu sorriso é o que lhe resta. Sorri, sorri e dança. Como se fosse morrer dali a pouco.

Cigana marota, bonita. Quem a vê dançar não e não sabe que sofre, a julga feliz. Cigana, cigana se engana. Pensa que é triste, mas não sabe que é moça e que a tristeza vai embora como sabe o velho feliz. Cigana, cigana, emana a beleza do povo, que não sabe o diz. Dança! Com os sinos do mundo a tocar só pra ela, cigana criança, corre de si.

Ingênua, cigana, dança. E liberta, ela e o mundo, dos males, da dor. Cigana, me encanta, e dança, dança, não para, criança: continua a sonhar! Que todos os sonhos são feitos de dança, cor e magia, perfume de flor e canção de ninar.

Dança, criança e não para, que o mundo é só teu. O palco de terra e a luz da lua que nasceu. Corre, aproveita, o momento que a vida te deu. Dança, gira, toma posse do que já é seu, cigana, se engana: quando pensa que o amor já morreu.
 
Beeijos, Jaqueline.

Um comentário:

Eline Emanoeli disse...

Aff, quem tem talento é outra coisa né?! Hehe!
Parabéns, ótimo texto, Jaque.
Li ouvindo a música e... foi mágico!
Sem palavras... adorei! Mesmo!
O template também tá lindo. Blog super bem cuidado hein! Aí sim :)

Beeeeijos ;*