Manoel de Barros
Tem histórias que são tão nossas que não fazem sentido contar pros outros, mesmo querendo contar para todo o mundo. Tem histórias que são tão nossas, tão profundas e verdadeiras, que poderiam ser contadas em uma frase, sem vírgula e nem respiro.
Escrevo pois acho que tenho memória ruim e tem momentos que não admito esquecer.
Como quando você estava na varanda, encostado na porta de vidro: pijama e cigarro na mão. Eu largada no sofá, segurando o celular. Perguntei se queria ouvir minha música, a que escolhi pra minha entrada no grande dia. Você disse que sim e eu liguei o som.
Seus olhos fitavam o ar, mostrando os ouvidos atentos. Fixei meu olhar ali, ora nos seus olhos azuis, ora na sua boca. E fui vendo pouco a pouco sua expressão mudar. Quando a música deu aquela virada, seu corpo engasgou com o compasso do seu coração e você me olhou arregalado. Sorriu e vi o brilho azul marejar conforme o sorriso abria. Você levou a mão no coração e deu uma tossida tudo ao mesmo tempo, sem deixar de sorrir. Sem que seus olhos perdessem aquela magia...
Você disse "ai, quase chorei, aff maria"...
E eu ri. Ri de alegria transbordando e disse: "pode chorar!"
Encantamento. Nunca vou esquecer dessa noite.
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