terça-feira, 27 de março de 2018

Que sorte a nossa, hein

Algumas pessoas vão te odiar pelo que você é. 
Outras, te amar pelo mesmo motivo...

Pessoas diferentes já me falaram, em momentos diferentes, que existem pessoas que despertam o nosso pior. Pessoas que podem até ser boas pessoas, mas que quando se aproximam entram em colisão. Faíscam. Fervem. Explodem. Fogo e gasolina no pior sentido da expressão.

Assim sendo, existem também pessoas que despertam o nosso melhor. Eu sempre achei que o máximo que alguém poderia fazer em nós fosse despertar a vontade de ser melhor. Mas não. Há um grau além. Existem as pessoas que despertam algo em nós, tão poderoso, que simplesmente fomenta nossa versão mais aprimorada. Que nos faz mais calmos. Mais gentis. Mais atenciosos, pacientes, altruístas. Pessoas que, sem nem saber, nos inspiram a sorrir mais, falar mais baixo, rir mais alto, dançar no meio da sala. Pessoas que despertam em nós a serenidade para lidar com os problemas. Pessoas que nos põe sal - e apuram o sabor bom que já temos. Gente que nos adoça - e nos faz mais carinhosos, mais serenos, mais alegres.

Tem gente que nos faz querer ser abrigo. Ser porto. Ser casa. Que nos mostra sem dizer que os lugares de paz não precisam, necessariamente, ser lugares. Que seu lugar de paz pode ser um par de olhos. Um par de braços ao seu redor. Gente que te inspira a fazer coisas que você nunca pensou em fazer. Que te faz querer sr uma especialista (mesmo que seja em simples panquecas...).

Algumas pessoas te amam pelo que você é. De cara lavada, barriga flácida, mau humor matinal. Amam seu jeito de falar da vida, o que você escreve, como ganha dinheiro, como atende o telefone. Tem gente que ama a gente pelo nosso ovo frito redondinho, com a gema no ponto. Ama nossos pés gelados, nossa preferência por banho quente, nosso gosto musical. Tem gente que ama a gente pelo nosso jeito de cantar, nosso silêncio ao ouvir, nossa vontade de comer doce, nossa atenção ao escolher o chocolate certo.

Tem gente que ama nosso jeito de encarar, como se pudéssemos despir a alma do outro só com os olhos. Gente que ama nosso ronco estranho, nossa impaciência, nosso café forte. Tem gente que nos ama até mesmo pelas coisas que a gente não percebe que faz. E que quando a gente pergunta a pessoa diz "só continua"...

Tem gente que nos ama, porque a gente fica. Porque a gente entende, mesmo quando ninguém mais poderia. E ama a gente porque a gente ama de volta. E leva o outro com a gente - no show, no cinema, em casa, pro nosso mundo. Nos ama, porque a gente aceita. Porque a gente pergunta. Tem gente que nos ama porque a gente responde - com paciência e carinho com a dúvida  do outro.

Gente que ama nosso carinho. Nosso azedume. Nosso charminho. A cor do nosso olho, o formato da boca, nossas tatuagens.

Gente que ama até mesmo nossa família. Nossa história, as coisas que aprendemos. Gente que ama nossa série favorita, nosso bolo favorito, os estalos dos nossos dedos.

Tem gente que nos ama pelo que somos e ama do jeito mais puro e simples possível. E, as vezes, acaba acontecendo da gente poder amar de volta essa pessoa, pelo mesmo motivo. 



Que sorte a nossa, hein.

sexta-feira, 23 de março de 2018

Just for today

Ainda não decidi se hoje comemoro trinta ou quarenta dias. Não sei quando comemoro um pedido aceito não com um sim, mas com muitos deles, em vários momentos diferentes. Que dia é dia de sorrir pras nossas escolhas? 

"Só por hoje. Viver. Amar. Se importar. Demonstrar. Como se não houvesse amanhã... Hoje é o dia mais importante. Na verdade hoje é tudo o que temos. Amanhã não existe. Não é? Então é como se fosse uma filosofia de vida... Fazer o que tem pra fazer. Hoje. Dizer que ama, dizer que se importa, demonstrar uma simpatia, compaixão. Hoje. E amanhã é outro dia. E aí começa tudo de novo."

Se hoje é tudo o que temos, se o futuro não existe, se a única garantia que temos do amanhã é o nosso desejo de que ele chegue e seja,... Hoje é o dia certo. Agora é a hora exata. De viver, de estar, de celebrar. De dizer coisas sempre guardadas pra datas especiais ou momentos oportunos. De olhar pras coisas doloridas e pras coisas leves. Hoje é o dia pra fazer o que você não achou que faria tão cedo. Dizer o que parece sem sentido dizer. Aprender. Superar. Mudar...

Se hoje é tudo o que temos, o hoje é também um presente. Tivemos um dia a mais. Acordamos. Não acredito que um dia a mais seja também um dia a menos. Não temos prazo de validade. Temos apenas a promessa de que, um dia, essa aventura louca que é a vida acaba - e que pode ser hoje mesmo. Assim, como esperar? Como deixar pra depois? Como não carregar uma bagagem cheia de urgências?

Assim, como não prestar atenção ao primeiro pensamento do dia, aquele que vem antes mesmo de abrirmos os olhos? Como não prestar atenção nas mãos que se procuram e se encontram durante o sono na madrugada ou na tarde de domingo? Como não ouvir com muito mais atenção cada música? Como não fazer doer as bochechas com tão largos sorrisos? Como não procurar entender o outro e as surpresas que a vida impõe com um pouco mais de serenidade? Como não se permitir ser um tolo, romântico, apaixonado...? Como poderíamos?

Sabendo que o hoje é tudo o que temos, como nos preocupar com as regras? Com as bobagens que aprendemos sobre o que pode, quem pode, quando pode...? Como poderíamos viver os dias economizando - tempo, entrega, histórias, elogios, sorrisos e até mesmo lágrimas que nos "expõe" e nos "deixam vulneráveis"?  Sabendo que o amanhã pode não chegar, como poderíamos...?

Foram quarenta dias em que dois desertos que se encontraram e, juntos, se descobriram oásis. De onde jorrou água e luz, verdade e desejo. Onde um despertou - sem ter pretendido - o melhor do outro e o melhor em si. Trinta dias de olhos e ouvidos atentos.

O Amnésia não viu nem relatou nenhum outro envolvimento tão intenso quanto esse - algo me diz que nunca o fará -  tão rápido ou tão louco. Nunca me senti tão pertencente a mim quanto hoje e ao mesmo tempo nunca estive tão empolgada com a possibilidade de partilhar - minha vida, minha história, meus sonhos, meu futuro -  com ninguém.  Ainda me assusto quando penso que conheci minha sogra no segundo dia, fui pedida em namoro no sétimo, te apresentei pros meus pais no décimo... E ainda me surpreendo com meus pensamentos à longo prazo, sempre com você.

Mas se o hoje é tudo o que temos... como poderia ter deixado cada uma dessas coisas pra amanhã?

O amanhã não existe. Mas sinto que, se existir, estarei exatamente aqui, olhando pra você.



"Quando seu lugar de paz não for um lugar... Fique. "

terça-feira, 13 de março de 2018

Fui em direção à porta, com o coração ansioso. Pensava em aguardá-lo chegar. Quando saí, ergui a cabeça e, num pulinho, brequei o caminhar. Déjà vu. Lembrei da primeira vez que o vi, da primeira vez que seus olhos se conectaram com os meus. Eu entrava distraída; ele, de cabeça baixa. Parei em frente à ele e o olhei enquanto fingia inutilmente procurar um lugar pra sentar. Pensei se deveria dizer oi. Ele, com os cotovelos apoiados na mesa, os ombros erguidos e a cabeça baixa. De repente... Ele ergue a cabeça e me olha. Me vê. Me encara. Encarei de volta. Sorri. Sorrimos. Dei a volta na mesa e o cumprimentei com um beijo no rosto, daqueles em que os lábios mal tocam a pele e, sutilmente, me afastei, como se aquele brilho azul dos olhos dele não tivesse me cegado e como se aquele meu sorriso tivesse outro motivo pra existir. Você nem imagina o que te espera...

Não imaginava. E, se imaginasse, não acreditaria.

Quando saí, vi primeiro seus olhos. Depois aquela camiseta azul com minúsculos coqueiros que tanto destaca seus olhos e, em suas mãos, um generoso buquê delas, minhas preferidas. As rosas aparentemente refletiam nas maças do rosto dele e o sorriso fazia os olhos brilharem. Sim. Aquele brilho do déjà vu. Tudo aconteceu num segundo. Olhei para o lado, ruborizada, disfarçando as lágrimas que surgiram nos olhos e fiquei ali, parada, rindo, esperando as lágrimas evaporarem. 

Fui até ele e o abracei, antes mesmo de pensar em lhe beijar ou pegar as flores. O mundo parou. Fiquei ali por um bom tempo, agradecendo. Obrigada, obrigada, obrigada. Não sei se em voz alta...


Hoje mesmo falei sobre a loucura dessa sintonia.  Sobre a probabilidade quase nula de encontrarmos alguém com pensamentos, gostos e intenções tão similares aos nossos num raio de 10km. Se alguém me contasse essa história, eu duvidaria, pois sou uma cética. Há um mês atrás eu não acreditava em amor à primeira vista...

Pra mim, amor sempre foi construção. A questão é: quanto tempo leva pra construir algo que, aparentemente, você planejou por toda uma vida, mas para o qual você sequer estava dando atenção, há trinta dias atrás? Quanto tempo é o tempo certo? 





"A vida não pode ser economizada para amanhã. Acontece sempre no presente." - Rubem Alves

segunda-feira, 5 de março de 2018

Tô nem aí (ou "Quem sabe Isso Quer dizer Amor")


“Tenho uma espécie de dever de sonhar sempre, pois, não sendo mais, nem querendo ser mais, que um espectador de mim mesmo, tenho que ter o melhor espetáculo que posso.”

– Bernardo Soares (Fernando Pessoa), do “Livro do Desassossego”. Lisboa: Tinta da China, 2014.


A gente cresce ouvindo falar de amor. Amor eterno. Amor à primeira vista. Amor verdadeiro. 


Cresce ouvindo canções que descrevem como é estar apaixonado (é parecer um ser ridículo e não estar com isso nem aí...), quais as sensações de se estar com quem se ama e longe desse pessoa e temos frases e poemas pra cada estágio de relacionamento. Vimos diversos filmes. Lemos diversas histórias. Escrevemos muitos blogs... Mas, aparentemente, o amor é um sentimento que não envelhece. Ele é sempre novo. Quando chega e se instala, a sensação é de que nunca nos sentimos assim antes (talvez seja verdade), de não saber como viver ou expressar aquilo. 


Afinal, em quanto tempo é possível se apaixonar por uma pessoa? Cinco meses? Cinco semanas? Dias? Cinco minutos? Nós nos apaixonamos depois do primeiro beijo ou antes, quando começamos a deseja-lo? Nos apaixonamos quando queremos a pessoa só pra nós ou quando queremos apresenta-lá pra absolutamente todas as pessoas e tornar público aquele encontro?


É amor quando queremos a pessoa na nossa casa ou só quando queremos o mundo com ela? É amor quando a vontade de se arrumar e ser lindo vence a preguiça ou só quando vc se sente totalmente a vonota de ao lado da pessoa de cara lavada, pé no chão, fritando ovo, lavando a louça ou picando cebola? É amor o que transborda a cada toque? É amor quando?

Quando os susporos são tão frequentes quanto ficar sem fôlego? 

Quando as músicas fazem mais sentido e nem mesmo a quarta feira de cinzas tira a alegria do carnaval?

É isso que é o amor?  

Essa semana li que só é amor quando você não quer mudar nada na outra pessoa. Quando  quem o outro é passa a ser tão suficiente que não te passa pela cabeça nenhuma correção  ou melhoria a ser feita. 


Então,  se não for amor, não sei de mais nada...

sexta-feira, 2 de março de 2018

ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro

Sobre o que eu vou escrever se você for melhor do que esperar por você? Qual o destino desse espaço, se nele só houverem textos leves e felizes e sorridentes e apaixonados? Será que decepcionarei meus poucos leitores com tanto açúcar? 

Ontem, não chorei. Mas tive vontade diversas vezes. O coração, palpitando até agora, era só alegria; o sorriso aberto, rasgado, largo, de doer a mandíbula; os olhos brilhando de excitação, encantamento, surpresa. As mãos encaixadas perfeitamente, o perfume entrando pelas narinas e indo morar nos meus pulmões pra me lembrar de quem finalmente estava por perto...

Até agora, quando fecho os olhos vejo duas fotografias: a primeira de uma Ana Cañas leoa, vista de perfil com um macacão jeans de lycra, os pulsos cheios de pulseiras erguidos, uma das mãos segurando o microfone, a cabeça levemente jogada para trás, o holofote em foco, como se Deus abrisse os céus pra abençoar tanto talento.

A outra é de um casal abraçado no saguão do Sesc ao fim do show. Ele, mais alto e loiro, vestia uma camisa lilás (ou talvez fosse azul...); a barba feita; o sapato novo. Ela, de macacão descolado preto e branco, sapato de verniz e um imenso lenço verde musgo sobre os ombros. Passava os braços por cima dos ombros dele, que se inclinava levemente, de forma que ela não precisava ficar na ponta dos pés. Seus braços contornavam a cintura dela e suas mãos iam descansar nas suas costas, num toque firme e intenso. 
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As pessoas passavam, aposto que algumas olhavam, tentando entender o que acontecia. Confesso que nem vi. Estava conectada a essa imagem. Um casal abraçado em silêncio, celebrando a partilha de um momento tão rico e especial. Aposto que não tinham palavras, ainda, pra descrever. Que, no silêncio, apenas agradeciam ao universo por essa oportunidade. De se estar ali. De estarem juntos. De terem olhos e ouvidos e pernas e mãos e a chance de ouvirem tão fantástico tributo. 

Calados, sentiam seus corações disparados, ainda ouvindo a voz rouca de uma cantora e o sotaque forte da outra. Sorrindo, se afastaram um pouco. Se olharam e se beijaram e sorriram de novo. Deram as mãos e se foram. Iluminados. Apaixonados. Em paz.