Ando tão à flor da pele, que qualquer inseto na varanda me faz chorar...
E mesmo eu, com toda a terapia, já entendo quem diz que grávida tem medo de tudo. Mesmo assim, sigo escolhendo confiar na natureza do meu corpo pra cuidar de tudo.
Ao longo da gestação, já caí - literalmente - três vezes e foram momentos bem assustadores. Cada um com a sua intensidade. Mas nada é tão assustador quanto aquelas lágrimas que sobem da garganta, ardem o nariz e escorrem desavergonhadas e mudas. Mudas porque não falo. Não sei que dificuldade é essa de dizer o porquê choro. Já tá chorando mesmo, desgraça, se fosse pra disfarçar, que engolisse as lágrimas, como a humanidade vem fazendo há milênios.
E aí, porque não falo, a garganta arde e se aperta.
Me sinto só.
Só, com a torneira que não funciona, com a bagunça que não acaba, com a sujeira no chão e a pia cheia. Me sinto só com os chutes de dentro pra fora, com a grana que não chega no fim do mês. Me sinto só com a comida por fazer, com a falta de ar sob a máscara, em ser a única sem cerveja no almoço de domingo. Me sinto só. Em não me encontrar nas conversas dos homens sobre futebol e nem no futrico feminino lá na sala. Me sinto só no movimento de estar junto. Em tantos momentos que já nem sei se a coisa é assim mesmo ou se estou exagerando por causa dos hormônios. Me sinto só.
Só no sofá. Só na insônia de madrugada. Só na preocupação.
Parece que aos poucos a mulher vai ficando mais e mais opaca, mais e mais transparente e invisível. Talvez pra dar lugar à mãe. Imagino que o processo pra ambas coexistirem demore a acontecer... Não queria. Acho que a mãe se sentirá só sem a mulher.
Me sinto só. Me sinto infantil diante das minhas tantas necessidades emocionais. Diante de tantas demonstrações que espero receber. Me sinto só por estar fisicamente bem e não poder me vangloriar mas, também, não poder reclamar. Me sinto só.
Como se ninguém entendesse o quanto de coisas acontecem sob um corpo grávido. Parece, pra quem olha de fora, que estou apenas grávida. Algo mais natural impossível, certo? Mas, definitivamente, esse processo visível vem acompanhado por uma porção de outros, cada vez mais intensos.
E nem os gatos ligam mais pra mim, habituados que estão com a minha constante presença em casa durante a pandemia. E ao redor de casa, tudo é silêncio. Crianças não gritam, mães não falam ao telefone, furadeiras cansaram de trabalhar. O silêncio é absurdo. Por isso fico tapando ele com músicas e podcasts. Hoje, que não o fiz, me sinto só.
Só. Somente só.
Queria colo, queria ser mimada como se estivesse a fazer - e estou - o mais importante dos trabalhos e todo o resto pudesse esperar porque agora só me mimar importava. Queria ser constantemente abraçada e que me lembrassem de beber água, com o copo já na mão. Peguei pra você. Quer sim! Queria não ter tempo pra sentir falta dessas miudezas. Queria não ter que fazer pedidos.
E além de só, queria não me sentir culpada por cada um desses sentimentos. Queria não ter vergonha e nem pensar que, ao sentir-me assim, magoo alguém que, de repente, acredita que está fazendo o que deve como deve. Me sinto só e culpada. Me sinto carente e nunca gostei de ser essa pessoa - talvez por isso ainda seja...
Sinto o inferno astral se instalado com força. Os fins dos ciclos são sempre pesados, pra quando acabar mesmo, a leveza se instalar.
É como dizem... Vai passar.
Mas enquanto não passa, é isso.